Esperança atrás das grades
IURD intensifica trabalho de evangelização nos presídios de
todo o País. Milhares de voluntários promovem ações sociais e levam a
Palavra de Deus para dentro das celas
redacao@folhauniversal.com.br
Há 12 anos, a rotina do obreiro Élvis
Lima Silva é a mesma: de segunda a sábado, ele atravessa os inúmeros
portões de segurança que separam a rua das celas dos detentos dos
Centros de Detenção Provisória (CDPs) de Osasco, Pinheiros e
Carapicuíba, em São Paulo, para levar a eles mensagens de esperança e a
Palavra de Deus. “Foi Ele quem me tirou da cadeia”, diz o
ex-presidiário, que foi batizado dentro de uma penitenciária, onde ficou
por 3 anos e 2 meses. “Errar é humano, só que mais humano ainda é
ajudar quem errou. A transformação do ser humano é quando ele deixa as
coisas erradas de lado e passa a fazer as coisas conforme a vontade de
Deus. Aí ocorre a transformação.” Silva é apenas mais um dos cerca de
2,5 mil voluntários da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) de São
Paulo que, semanalmente, visitam cerca de 120 unidades prisionais das
150 existentes no Estado, com o objetivo de levar conforto e uma palavra
de fé e, com isso, proporcionar a ressocialização dos detentos.
Toda
a comunidade carcerária é beneficiada pelas orações que são realizadas
por pastores, obreiros e evangelistas, que realizam reuniões e batismos.
Além disso, a IURD promove também ações sociais dentro das unidades
prisionais, como doação de material de higiene pessoal, apoio a
dependentes químicos e distribuição de exmplares da Bíblia, revistas,
livros e folhetos contendo mensagens de fé e incentivo. “A sociedade
espera uma mudança da população carcerária. Mas é preciso uma mudança
que venha tanto com a ajuda espiritual como com a assistência social. É
preciso que esses dois pilares sejam trabalhados juntos. E nós
trabalhamos nessas duas frentes”, afirma o pastor Afonso da Silva,
responsável pelo trabalho de evangelização nas unidades prisionais de
São Paulo.
“É muito importante o trabalho da IURD
porque a gente está aqui esquecido de tudo e de todos, mas recebemos
esse apoio da Igreja Universal. A gente ouve palavras amigas e só com
Deus a gente vê que o crime não compensa”, diz um preso de 33 anos,
acusado de tráfico de drogas, logo após ser batizado no último dia 26
dentro do CDP-I de Osasco, em São Paulo. “A Igreja ajuda a gente a não
abandonar o caminho da família, da paz, do amor e da harmonia”, diz
outro detento.
O projeto de ressocialização da IURD se
destaca ainda por meio de oficinas e de eventos para os presos, que
incluem realização de casamentos e encontros familiares em datas
especiais. “A Igreja Universal ameniza mesmo o sofrimento. O preso muda
da água para o vinho, depois de ser convertido. O comportamento melhora e
vemos que ele fica mais calmo”, diz Maurício de Freitas, diretor
técnico do CDP-I de Osasco.
E essa mudança está no discurso daqueles
que, com a ajuda do grupo de evangelização da IURD, aguarda o dia da
tão esperada liberdade atrás das grades. É o caso de José (nome
fictício), de 42 anos, que foi batizado dentro da prisão em 2010 e já
virou um dos líderes dos obreiros dentro do Pavilhão 1 do CDP-I de
Osasco. Ele garante que vai seguir essa missão de levar a Palavra de
Deus nos presídios até o fim da vida. “Entrei com um monte de acusação
nas costas e só então conheci o trabalho da Igreja. Bebia, usava drogas e
estava nas trevas, mas quando desci às águas eu já percebi a grande
mudança. Foi como se eu trocasse meu chip e começasse uma vida nova.”
Pelo País
Com uma população carcerária de quase
meio milhão de pessoas, o Brasil ocupa o quarto lugar no ranking dos
países com a maior população prisional do mundo, segundo dados do Centro
Internacional de Estudos Penitenciários, do King’s College, no Reino
Unido. Neste cenário, o trabalho dos grupos de evangelização da IURD em
presídios e delegacias é de extrema importância – ainda mais se
consideradas as condições precárias e a superlotação que a maioria dos
internos enfrenta – e vem se intensificando não apenas em São Paulo, mas
em muitas das mais de 1,2 mil unidades prisionais de todo o território
nacional.
No Rio de Janeiro, onde este tipo de
iniciativa foi posta em prática pela primeira vez pela IURD em 1990,
este ano mal começou e, apenas no mês janeiro, já foram realizados mais
de 100 batismos nas 68 unidades de detenção assistidas pelos agentes
religiosos da Igreja Universal no Estado, incluindo presídios,
delegacias e Centros de Atendimento ao Menor (Criam), além de 13 Centros
de Recuperação de Viciados.
Segundo o pastor Júlio Pinheiro,
responsável pelos evangelistas da IURD em penitenciárias do Rio de
Janeiro, são cerca de mil batismos por ano. Em mais de 2 décadas, houve
aproximadamente 21 mil batismos e 90 matrimônios realizados em unidades
prisionais no Rio.
O
pastor Júlio conta ainda que, no começo, foi difícil implantar o
projeto. “Hoje o trabalho realizado diariamente pelos cerca de 150
voluntários da Igreja Universal é reconhecido e parabenizado por
autoridades.”
Adilson Resende, de 52 anos, é prova de
que o trabalho de ressocialização da IURD é capaz de transformar vidas.
Sem rumo, morou nas ruas por 16 anos, tornou-se dependente químico e
entrou para o mundo do crime. Ele só conheceu os ensinamentos de Deus e
foi evangelizado quando já estava preso. “Falaram-me que Deus podia
mudar a minha vida”, conta. Beneficiado pelo bom comportamento, Resende
recebeu uma condicional. “Mas sem ter casa para viver e longe da
família, fui morar novamente nas ruas. Fiquei sem teto por 2 anos e,
mais uma vez, fui evangelizado.”
A partir de então, ele passou a
frequentar diariamente a IURD de São Cristóvão e conseguiu emprego.
“Depois de ser batizado, passei a evangelizar nos presídios, contando
para todos os encarcerados o milagre que Deus fez na minha vida”,
relembra. “Consegui reencontrar minha família, tornei-me obreiro,
auxiliar e, depois, me casei. Propago o Evangelho há cerca de 20 anos,
como pastor da IURD.”
Na Bahia, onde há uma população
carcerária de cerca de 10 mil pessoas, há 250 voluntários da IURD – 140
deles só em Salvador e região metropolitana. Eles realizam este
trabalho em mais de uma dezena de presídios e delegacias, além de
eventos especiais em unidades prisionais em outras localidades. Para
este semestre, já estão previstas ações nas cidades de Jequié, Vitória
da Conquista, Paulo Afonso, Porto Seguro, Ilhéus e Itabuna.
Diante da atual realidade carcerária
brasileira, o advogado João Astor Mendonça Lisboa, especializado em
Direito criminal, pós-graduado em Direito Penal e Processual Penal,
declara que a ressocialização é muito difícil, uma vez que o Estado não
cumpre a sua parte, e elogia o trablaho da Igreja Universal. “O Estado
pune, porém, não está preparado para devolver à sociedade o homem que
ficou segregado do convívio em sociedade e foi tratado de uma maneira
que, com certeza, o revoltou ainda mais. A Igreja Universal tem ajudado
muitos internos.”
Família
E
o trabalho da IURD não se limita apenas aos milhares de homens e
mulheres que cumprem pena atrás das grades. A evangelização e a
assistência social se estendem também às famílias dos presidiários. Seja
com o fortalecimento espiritual, seja com cafés da manhã para aqueles
que madrugam nas filas em frente às penitenciárias no dia de visitas ou
distribuição de
cestas básicas.
cestas básicas.
A costureira Francisca Maria da Silva
Simões, de 52 anos, que frequenta a Igreja Universal há alguns anos,
sabe da importância desse apoio. O filho dela está preso e condenado a
20 anos. Desde a sua prisão, há 6 anos, ela diz ter passado por uma
grande depressão. Segundo ela, porém, a ajuda dos pastores e obreiros
que cuidam do trabalho de evangelização com os familiares dos presos foi
essencial para que ela pudesse se reerguer. “Não é sempre que posso
visitar o meu filho na prisão, porque ele está bem distante de São
Paulo, mas, quando vou, levo livros, jornais e Bíblias, todos doados
pela IURD. Além disso, eles me ajudam muito em oração, porque é muito
triste você ter um filho preso”, diz Francisca, com lágrimas nos olhos,
levando consigo uma cesta básica, que acabara de receber dos
voluntários, na matriz da IURD, no bairro Brás (zona leste de São
Paulo).
Pelo rádio, palavras que confortam
O trabalho da IURD nas unidades
prisionais do País continua mesmo quando os voluntários não estão
presentes fisicamente entre aqueles que estão detidos. Existente há 20
anos, o programa “Momento do Presidiário” é transmitido todos os dias
para todo o Brasil por meio da “Rede Aleluia”. Em todos os Estados, a
programação é comandada por um pastor que leva apoio espiritual e uma
palavra amiga aos milhares de encarcerados e familiares de detentos. Por
meio do rádio, os presos podem participar de orações, acompanhar a
Palavra de Fé e receber recados de seus parentes, que ligam ou enviam
cartas que são lidas ao vivo durante o programa. Os ouvintes também
contam com uma equipe de advogados, que auxiliam nas respostas
jurídicas.
De presidiário a empresário
O
sorriso sincero e os olhos brilhantes do empresário da construção civil
Marcos Cesar Datri, de 38 anos, retratam hoje o prazer em viver
dignamente e, acima de tudo, em paz. Por onde quer que vá, Datri garante
que é respeitado e já não carrega mais as marcas de um passado sombrio e
cruel pelo qual passou envolvido na criminalidade por mais de 10 anos.
“Conheci os vícios aos 8 anos, me envolvi em furtos ainda menino, depois
nos roubos, no tráfico e, aos 15, comandava um cassino dentro de uma
favela em São Paulo. Essa vida errada era motivo de orgulho para mim.
Não me sensibilizava com ninguém, era violento. E quem descumprisse as
regras do crime pagava com a própria vida ”, comenta.
Condenado por vários crimes, dentre os
quais, roubo, tentativa de homicídio e homicídio, ele passou por
diversos distritos policiais e cadeias públicas de São Paulo, inclusive
pela extinta Casa de Detenção, mais conhecida como Carandiru.
Datri relembra, com lágrimas nos olhos,
que enquanto esteve preso, viu a família definhar, soube da morte dos
pais, ficou longe dos quatro filhos que teve de três relacionamentos
distintos e, por fim, foi abandonado pela última esposa. Apesar de
passar por momentos de muita revolta, diz, foi no Carandiru que ele
encontrou as respostas para os seus dilemas, ao ser evangelizado dentro
do cárcere.
“Eu estava completamente drogado quando
recebi o convite de um outro preso para participar de uma reunião.
Aceitei e, desde então, nunca mais abandonei a minha fé. Participava de
todas as reuniões e orações. Tempos depois, me batizei nas águas. Depois
disso, ainda permaneci preso por quase 4 anos. Para quem era conhecido
como ‘Marcos Psicopata’, hoje sou obreiro da IURD da Consolação (região
central de São Paulo), onde cuido do grupo de evangelização nos
presídios, me casei e acabei de formalizar a minha empresa. Minha vida
hoje é completamente transformada.”
Mudança radical
Apesar
de conhecer o trabalho da Igreja Universal desde os 12 anos, quando
acompanhava a mãe às reuniões, Valter Natalino de Jesus, de 28 anos,
começou a se envolver com amizades erradas durante a
adolescência.Conheceu o lado fácil de ganhar dinheiro e acabou pagando
um alto preço, revela: “Quando minha loja de produtos contrabandeados e
roubados foi fechada pela polícia, comecei a praticar pequenos furtos e
assaltos a mão armada. Mas foi em uma viagem de carnaval para
Pernambuco, em 2007, que pratiquei um assalto e fui preso e condenado”,
lembra.
Natalino de Jesus gastou todo o dinheiro
que tinha para tentar uma transferência para São Paulo, mas nada
conseguiu e ficou preso por 2 anos e 3 meses longe da família. “Esse
período foi um inferno. Fiquei longe de tudo e de todos, foi terrível”,
relembra.
Quando
saiu em liberdade condicional (e ainda está), em junho 2009, Valter diz
que estava determinado a mudar de vida. “Entreguei-me a Deus, de fato e
de verdade, e minha vida mudou por completo. Hoje trabalho como
supervisor de obras, me casei e tenho uma família abençoada. Cuido de um
grupo de evangelismo da IURD que dá apoio aos familiares de presos, e
um dos membros deste grupo é a minha mãe!”, conta, orgulhoso.
“Quando Valter foi preso eu já fazia
parte de um dos grupos de evangelização da IURD com os familiares dos
presos e passei a me dedicar ainda mais, pois sabia que outras mães
passavam pela mesma situação que eu e precisavam de ajuda. Tive muito
apoio espiritual de todos da Igreja e, com isso, pude buscar em Deus a
solução para a vida do meu filho”, completa Maria José A. Lopes, de 49
anos, que faz parte da IURD há 16 anos.
Colaboraram: Fernando Poffo, Ivonete Soares, Vanessa Sendra, Ticiana Bitencourt
Folha Universal
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