domingo, 18 de dezembro de 2011

Minha culpa

 Minha culpa
  CAPA
publicado em 18/12/2011 às 00h00.

Deixe para trás as frustrações, não fique remoendo como num filme repetitivo, aprenda com os erros e trace planos possíveis por uma vida mais feliz

Fernando Poffo e Talita Boros
redacao@folhauniversal.com.brom.br


Um dos sentimentos mais angustiantes e destruidores do ser humano, a culpa assombra a vida de muitas pessoas, principalmente nessa época, quando paramos para fazer um balanço do ano que está terminando. O pouco tempo dedicado à família, a irresponsabilidade com a saúde, a falta de iniciativa no trabalho são coisas que começam a pesar. Agora, com mais um Ano Novo chegando, aquele pequeno incômodo evolui para a culpa, que tira o sono, autodeprecia e corrói por dentro. Mas, como parte natural da vida, a culpa não é só negativa. Com função adaptativa, esse sentimento serve para auxiliar o aprendizado com as experiências dolorosas e negativas. O importante é aprender a minimizar os danos dela e, a partir daí, enfrentar a vida sob nova perspectiva.

Debinha, atacante da seleção brasileira, sentiu na pele a pressão da culpa depois de perder o pênalti que definiu a derrota verde-amarela na final do Jogos Pan-Americanos de Guadalajara, no México, realizado este ano. A jogadora, que completou 20 anos durante a competição, foi ao chão e começou a chorar assim que a goleira canadense defendeu a cobrança e deu o título para as adversárias do Brasil. Apesar de ter sido um dos destaques do Pan, Debinha confirmou o sentimento no momento da perda do ouro. “Ali na hora eu só queria ficar sozinha, pensar no que poderia ter feito de diferente. Mas foi muito bom as meninas chegarem para conversar”, lembrou. Debinha afirma que o trauma causado pela situação foi superado e diz que se fortaleceu com as recentes derrotas (no Pan e com o vice no Campeonato Paulista pelo time do Centro Olímpico). Segundo ela, as duas situações serviram de aprendizado e devem incentivá-la para a conquista da primeira medalha de ouro para o Brasil na Olimpíada de Londres, em 2012.


Segundo a psicóloga Marina Vasconcellos, especializada em psicodrama terapêutico, a culpa aparece quando uma pessoa acredita que fez algo muito errado ou que magoou alguém. Marina explica que o primeiro passo para vencer o sentimento é entender o motivo pelo qual ele existe. “Há gente que carrega a culpa dos outros. Por isso é importante saber primeiro se aquela culpa é sua. Se for, conversar e pedir desculpas é o início.” Ela diz que o pedido de desculpas funciona como marco para superar o problema e recomeçar.

A empregada doméstica Maria Helena Alves Rodrigues, de 57 anos, ainda sonha em retomar os estudos. Em 2011, mais uma vez ela repetiu a rotina de trabalhar por muitas horas e não colocou em prática o plano. José Augusto Alves, de 41 anos, trabalha como porteiro e também espera que em 2012 possa voltar a estudar para tirar uma culpa que sua mãe carrega há mais de 30 anos, quando o pai morreu. Alves tinha 9 anos e abandonou os estudos para ajudar a mãe, hoje com 63 anos. Desde criança ele trabalhou em açougue e até desenvolveu uma hérnia umbilical, tratada apenas neste ano. Depois da cirurgia, ele ficou proibido de fazer esforço e virou porteiro, mas aproveitou as férias em dezembro para trabalhar como sorveteiro. Para 2012, ele espera colocar em prática o antigo plano.

A psicóloga Marina dá dicas para que as pessoas não corram o risco de descumprir as metas de Ano Novo. “Primeiro adapte o plano à sua realidade. É muito comum que as pessoas tracem metas inatingíveis. Assim a chance de sentir culpa por não realizar é muito maior”, diz. Segundo ela, a frustração por isso acaba levando à culpa. “O lado bom desse sentimento é que ele estimula a humildade, ensina o reconhecimento dos erros e dá a possibilidade de reconstruir e ir em frente”, diz.

Uma das culpas mais comuns são as relacionadas às falhas com filhos ou família. Vencedor da terceira temporada de A Fazenda, o modelo Daniel Bueno confessou no programa Hoje em Dia, da “Rede Record”, uma grande culpa. Questionado por Edu Guedes sobre a relação com o filho Luke, ele contou que traiu a mulher e acabou perdendo tudo. Ele morava com a família nos EUA. “Perdi a coisa que sempre quis ter: uma casa, meu filho, perdi tudo. Desde lá tem sido difícil. Fiquei 2009 sem  trabalhar para ficar perto dele e tentar estruturar nossa vida. Eles voltaram para o Brasil e um ano depois eu vim. Tive que ficar convivendo com essa culpa.”

O operador de câmera Cristiano Alves, de 25 anos, sente que precisa doar mais tempo à família. Já teve dificuldade em 2011 para dar atenção à mulher durante a gravidez. Como sua filha nasceu no início deste mês, sabe que vai precisar se desdobrar para trabalhar e dar assistência à família. Assim como ele, o boliviano Ciro Mamane, de 30 anos, costureiro no Brasil há 7 anos, diz que se arrepende por não ter achado aqui as condições ideais de trabalho e nem o salário que imaginava. Agora que a filha nasceu, quer voltar para La Paz, onde nasceu, para criar a filha perto da família.

Menos peso para eles

Homem e mulher agem de modo diferente quando o tema é a culpa. Foi o que cientistas da Universidade do País Basco, na Espanha, concluíram após estudo com três grupos de pessoas com idades distintas (156 adolescentes, 96 jovens e 108 adultos), divididos igualmente entre os sexos. A conclusão foi de que elas se sentem mais culpadas do que eles. Isso não significa que as mulheres se sentem culpadas demais, e sim o contrário. São os homens que têm esse sentimento de menos.

Todos os participantes tiveram que apontar situações em que mais se sentiam culpados. O resultado mostrou que, independentemente da idade, a intensidade de culpa das mulheres é sempre maior. E essa diferença fica maior dos 40 aos 50 anos. Segundo os cientistas, isso revela que as antigas práticas educacionais e sociais ainda pesam muito na formação psicológica de homens e mulheres. Eles historicamente pertenceram ao mercado de trabalho, elas eram figuras domésticas, com lado social apurado. Apesar do enfraquecimento das diferenças nos dias de hoje, esses traços  permanecem.


Saiba como lidar com a culpa

1. Reconheça o tipo de culpa que você carrega e seu propósito

• Se a culpa aparece por termos ofendido alguém ou por gastar muitas horas no trabalho e esquecer da família, é um sinal de alerta. A ideia é: mude seu comportamento ou então saiba que você pode perder amigos e familiares.

2. Mude ou faça reparos na vida, cedo ou tarde

• A culpa saudável nos diz que precisamos fazer algo para reparar relações importantes para nós (às vezes, pode ser a própria autoestima). Quanto mais cedo “aprendermos a lição” com o erro que cometemos, mais cedo a culpa desaparecerá. E se a solução for bem-sucedida, o sentimento ruim nunca mais irá voltar.

3. Aceite que fez algo errado, e vá em frente

• Mesmo tendo tomado uma atitude errada, você tem que aceitar que não se pode mudar o passado. Você pode reparar o seu mau comportamento, se for preciso, mas depois deve deixar a situação seguir. Quanto mais nos concentramos que precisamos fazer mais pela situação, mais ela continuará a incomodar e interferir nos relacionamentos com os outros.

4. Aprenda com os maus comportamentos

• Normalmente o sentimento de culpa tenta chamar nossa atenção para que possamos aprender alguma coisa com a experiência. Se podemos aprender com nossos erros, temos menos chance de cometê-los novamente.

5. Ninguém é perfeito

• A busca pela perfeição em qualquer parte da vida é uma receita para o fracasso, já que nunca pode ser alcançada. O segredo é aceitar que somos apenas humanos. Não alimente durante dias, semanas ou meses a autoflagelação, senão você pode destruir sua autoestima.

Fonte: John Grohol, psicólogo norte-americano, criador do portal Psych Central, acessado mensalmente por 800 mil pessoas e eleito um dos 50 melhores de 2008 pela revista “Time”




Folha Universal



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